segunda-feira, 19 de abril de 2010

Avenida Paulista

A Avenida Paulista é a maior mentira do paulista.
É o cartão postal de uma cidade que só existe no imaginário do povo. É possível ver isso ao andar por ela em um dia comum.
Em dias comuns, a Paulista tem um cheiro peculiar, que mistura fumaça de automóvel, com churrasco e fritura, cigarro e perfumes caros. Ou falsificados. É difícil saber a diferença hoje em dia.
As vitrines das lojas estampam não só a moda do mundo, mas o quanto aquela realidade é distante de quem está por ali só de passagem. Numa plaquinha é possível ler: “Venha conhecer o INTERIOR da loja. Promoções 25% off”. E realmente, o número de pessoas paradas do lado de fora do vidro é sempre maior do que o das que estão do lado dentro.
Mas o mais belo da Paulista são os próprios paulistas. Eles se vestem e andam como se estivem mesmo num desfile de modas. Parece que a qualquer momento irão surgir câmeras da Globo para filmá-los e eles têm que estar prontos para isso! Até as vendedoras gastam seus salários nas lojas que trabalham, para poderem se vestir bem e desfilar nas calçadas na hora do almoço...
Mas não há como viver diferente na Paulista. Ser uma pessoa diferente é ser igual lá. Você é original, como todos! E todos com o seus cigarrinhos. Não há vida na paulista sem cigarro. O cigarro é a prolongação do corpo do ser-humano que habita a paulista. Aliás, que habita não... que circula.
A gente ouve pessoas que dizem “Eu AMO a Paulista”.
- Essas pessoas com certeza não trabalham na Paulista! Só se atreve a esse tipo de comentário quem freqüenta a Paulista esporadicamente. Seus centros culturais, os bares nos finais de semana, cinema, teatro, enfim... quem tem que pegar o metrô para ir e vir da Paulista todo dia, sabe que a vida é mais do que isso. Falo isso por conhecimento de causa. Quando trabalhei na Paulista as pessoas achavam que eu tinha todos os motivos para ser feliz lá... Feliz eu era, mas não por causa do lugar, nem das pessoas. Pelo contrário, na Paulista eu vi acontecer os fatos mais bizarros da minha vida.
- Todo dia, na hora do almoço, eu era abordada em média, por três pessoas diferentes me pedindo dinheiro. Óbvio! Todo mundo na Paulista tem dinheiro! É o melhor lugar para se pedir dinheiro. No dia em que cinco pessoas me abordaram no trajeto de ida e volta entre o metrô Brigadeiro e o quarteirão seguinte, eu fiquei muito brava! Uma delas era uma moça mais nova do que eu, mais bonita do que eu, com um bebê recém-nascido, pedindo dinheiro porque a criança estava com fome. Ela ia sufocar a criança, eu acho... já que nem dente tinha... O outro, um senhor alto e forte, saudável, só que com uma prótese no olho esquerdo. Ele enfiou a cara na minha frente e disse “Olha meu olho! Olha meu olho!” – eu quase bati nele! Dei um grito de susto e ele saiu pedindo pra deus me abençoar... Cara louco! Não é porque uma pessoa tem uma deficiência que as outras têm obrigação de dar dinheiro. Ao contrário, conheço cegos que trabalham, estudam em universidades e tantos outros com outras deficiências que vivem bem... a não ser que a deficiência da pessoa seja mesmo no caráter... mas também não justifica exigir dinheiro.
- A maior aventura ainda me esperava no final do dia. Todo mundo só fala do metrô da estação da Sé quando quer falar mal dos metrôs de São Paulo. Experimentem a linha verde na hora do rush... Mais pessoas, mais figuras, mais histórias... É cômico.
Então tem horas que a Paulista fica igual a qualquer outro pólo de comércio de São Paulo. O que diferencia a Paulista do Brás ou da 25 de Março? Talvez seja porque na Paulista as pessoas arranham um inglês, francês ou alemão, e nos outros lugares só se fala espanhol... e coreano... e árabe... Mas a essência é a mesma! E as chances da Globo ir filmar nesses outros lugares também são grandes... A diferença é que em outros lugares, ninguém está contando com isso e não se frustra, caso nunca aconteça.
É que na Paulista todo mundo quer ser estrela. Mesmo que seja por um segundo, num flerte saindo do metrô ou comprando um livro na Fnac. É comum de se ver entre homens e mulheres, o típico movimento de andar, olhar e jogar o cabelo, enquanto acende um cigarro, que diz “Eu transo muito e não ligo que as pessoas pensem que eu não presto. Se você quiser, talvez eu até tope, mas não espere que eu te ligue no dia seguinte!”. Há uma atmosfera de caça ao sexo na Paulista...
- É tudo fake. Enquanto essas pessoas desfilam pelas ruas querendo ser “gente rica e descolada”, a gente sabe que os grandes empresários, os chefes de verdade, nem conhecem a Paulista. Não percorrem cem metros nela que não seja entre os estacionamentos e os elevadores dos prédios.
- A Paulista é uma mentira... Ilude os corações das pessoas que nunca terão um espacinho nela... Estarão sempre de passagem.

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